de Claudia Pompa*
Embora as medidas de isolamento adotadas por diferentes governos da América Latina tenham conseguido frear a disseminação do COVID-19, elas resultaram em um aumento de casos de abuso doméstico em uma região onde milhões de mulheres e meninas sofrem violência sexual e física.
A epidemia de violência contra as mulheres não é novidade. Segundo dados da ONU Mulher, nos últimos 12 meses, 243 milhões de mulheres e meninas (entre 15 e 49 anos) em todo o mundo foram vítimas de violência sexual ou física por parte de seus parceiros. À medida que a pandemia continua, é muito provável que esses números aumentem, com um impacto terrível no bem-estar físico e mental e na saúde das mulheres, bem como em sua capacidade de participar e liderar a tão necessária recuperação social e econômica.
Dados emergentes de países da região estão começando a demonstrar a realidade sombria que as mulheres estao enfrentando durante esta pandemia. Na Argentina, a linha telefonica de apoio às mulheres registrou um aumento de 67% nas ligações em relação a abril de 2019. Na Colômbia, as ligações relacionadas à violência doméstica aumentaram 130% nos primeiros 18 dias de quarentena, enquanto no Chile o aumento foi de 70% durante o primeiro fim de semana de confinamento. Dados de São Paulo indicam um aumento de 45% nos casos de violência contra mulheres nos quais a polícia interveio no mês de março, enquanto no México as queixas aumentaram 25%.
As longas semanas de confinamento exacerbaram as tensões existentes relacionadas a questões como segurança, saúde, dinheiro, e aumentaram o isolamento das mulheres com parceiros violentos, separando-as das pessoas que podem ajudá-las e dos sistemas de apoio. Estudos mostram que os agressores tem maior probabilidade de matar suas parceiras como resultado de crises pessoais, incluindo a perda de emprego ou devido a contratempos financeiros significativos. A situação atual é, assim, um coquetel perfeito para comportamentos violentos a portas fechadas.
Cedo ou tarde, o confinamento terminará, mas enquanto ele continuar, o perigo aumenta. Embora ainda não haja dados oficiais sobre as taxas de feminicídio durante a pandemia, na Argentina as organizações da sociedade civil estimam que ela dobrou. No México, segundo dados reportados, 163 mulheres foram mortas durante a quarentena, 16 delas menores de 18 anos. Na Colômbia 12 mulheres foram assassinadas, e no Peru, 6. Talvez, o mais preocupante de tudo, é que os dados estão em contínua evolução e continuam aumentando.
O aumento da violência contra as mulheres deve ser tratado com urgência com medidas integradas nos níveis econômico e social. A prevenção da violência deve ser uma parte essencial dos planos nacionais de resposta ao COVID-19. Neste sentido, abrigos ou refúgios e as linhas de ajuda para mulheres devem ser considerados um serviço essencial em todos os países, com linhas de financiamento específicas e esforços conjuntos para divulgar seu funcionamento. Tanto a polícia quanto os serviços de justiça devem garantir que os casos de violência contra mulheres e meninas recebam alta prioridade, sem impunidade para os perpetradores.
A violência que está emergindo como característica desta pandemia é outro enorme desafio social a ser enfrentado. A luta contra a atual crise não diz respeito somente a sobreviver ao coronavírus, mas ao fortalecer-nos como sociedade, e as mulheres desempenham um papel fundamental nesse processo de recuperação.
* Claudia Pompa é analista política e pesquisadora paraguaia
Imagens: Isabella Quintana, Pixabay